Publicação original: Trends Magazine
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JOÃO VIEIRA
T Maria Cruz
“Fiz projetos em mais de 25 países diferentes e cada projeto é único”
Desde cedo, o contacto com maquetes de arquitetura conquistavam-lhe os dias livres. Desde cedo, passou a saber “ler projetos” e a entender a “representação tridimensional dos mesmos”. Era mais do que esperado fazer da arquitetura a sua profissão. João Vieira licenciou-se na Universidade Lusíada do Porto. Deu aulas na AHO (Escola de Arquitetura e Design de Oslo), passou pela Dinamarca, Holanda, Noruega, Estados Unidos e Brasil. Em 2021, mudou-se para Lisboa, onde fundou o Studio JV – tem mais de 80 projetos em desenvolvimento, entre os escritórios de Lisboa, Recife e Roterdão. Conta com mais de 20 anos de experiência e mantém, como sempre, o seu olhar atento, estratégico e rigoroso, a cada criação.
Sonhou com arquitetura, desde sempre?
Comecei a ter contacto com a arquitetura muito cedo, aos 16 anos. Um familiar tinha uma empresa de maquetes de arquitetura e eu ajudava a fazer as maquetes, nas minhas horas livres e aos fins de semana. Por isso, comecei muito cedo a saber ler projetos e a perceber a representação tridimensional dos mesmos.
Com o João Vieira ao comando, o atelier já desenvolveu projetos para diversos países. Quanto aos lugares por onde já passou e viu nascer projetos, com a sua assinatura, qual o que mais o encantou?
O trabalho de arquitetura varia muito de país para país. Durante a minha experiência a trabalhar noutros escritórios, fiz projetos em mais de 25 países e cada projeto é único. Através do nosso escritório, trabalhamos para o Brasil há 13 anos, e já estive envolvido em muitos projetos em diferentes estados, com escalas e programas muito diversos. Gosto muito de trabalhar no Brasil, pela sua energia e ambição. Em Portugal, desenvolvemos outros tipos de projetos, mas temos em curso vários com que me identifico muito, nomeadamente os que têm expetativas de sustentabilidade e complexidade muito elevadas. A arquitetura é feita para pessoas, e é o cuidado cultural que me seduz ao fazer projetos internacionais.
Quantos projetos têm em carteira no Studio JV? E quais destacaria, neste momento, por serem diferenciadores?
Atualmente, temos aproximadamente 80 projetos em curso no escritório em Portugal e no Brasil. Destaco os projetos em madeira e com índices de sustentabilidade muito interessantes. A realidade da arquitetura em Portugal está a mudar significativamente e temos o privilégio de estar envolvidos em projetos muito relevantes, de norte a sul. Todos são especiais, porém gosto especialmente do projeto industrial que estamos a fazer para a Kozowood Industries, em Esposende, por ser um programa novo para nós e por ser um projeto que produz toda a matéria-prima para muitas outras obras nossas que estão em desenvolvimento. “Farm to Table, Factory to Site”.
É-lhe mais desafiante idealizar e criar um projeto de raiz ou um de reabilitação?
A grande maioria dos projetos na Europa são na área da reabilitação, porém, a maioria dos nossos projetos são construções de raiz. Um projeto de reabilitação tem outras condicionantes que um projeto de raiz não tem. Para nós, o mais importante é perceber a expetativa de cada projeto, contribuir com inteligência e comunicação com os demais intervenientes.
A arquitetura exige um cuidado muito delicado na forma como se comunica e se constrói, sendo um processo longo e paciente. A nossa função é orquestrar este processo de uma forma criativa, técnica e cronológica.
Cada vez mais a arquitetura contribui para a sustentabilidade, o ambiente e o social, o que obriga a uma maior responsabilidade por parte do arquiteto. Tornou-se mais desafiante fazer arquitetura?
A sustentabilidade transcende a arquitetura. É uma contribuição fundamental e a arquitetura é apenas mais uma realidade. É importante percebermos as opções e ferramentas disponíveis e trabalhar com uma visão que permita fazer mais com o mesmo. Oxigenar desafios e traduzir problemas em oportunidades. Só esta postura quotidiana nos permite estar envolvidos em projetos de interesse relevante em diferentes escalas.
É fácil escolher os materiais para o tipo de cliente que procura o vosso atelier? O que é que o João tem mais em conta, no momento da escolha?
Os materiais que utilizamos variam bastante de projeto para projeto. No que diz respeito a materiais estruturais, sempre sugerimos a madeira, pela sua componente sustentável, e gostamos de trabalhar com materiais naturais de acabamento, tanto para soluções internas como externas. Os nossos clientes, quando nos procuram, querem algo relevante e harmonioso, e concordam que a utilização de materiais naturais muda completamente a perceção do projeto. Os nossos clientes são muito parceiros e entendem que estas soluções surgem de uma parceria longa, com muita confiança e iniciativa na apresentação de diversas soluções.
Com largos anos de experiência, hoje sente que a sua maturidade e conhecimento o deixam mais confortável, sempre que pega no lápis e no papel para desenhar um projeto novo?
Com certeza. Hoje o repertório é longo e a folha em branco não assusta (risos). A primeira ideia é o momento mais interessante, pois sabemos que depois dessa virão muitas outras. O nosso processo de trabalho é como um funil. No início exploramos várias soluções e depois vamos selecionando as que melhor respondem às necessidades do projeto para, no fim, chegar à solução mais coerente.
Que projeto gostaria ainda de desenhar?
Mais do que o programa ou a escala, gosto da visão do projeto. O mundo hoje exige uma reflexão sobre a forma como vivemos e trabalhamos e, na maioria dos casos, conseguimos fazer o mesmo de forma muito melhor.
Estou interessado na industrialização criativa da arquitetura e em como utilizamos a tecnologia, de uma forma gradual, para alcançar este desejo. Em Portugal, ainda vivemos um processo muito tradicional, mas estou otimista de que isso vai evoluir significativamente nos próximos anos. Temos profissionais e intervenientes com muita visão e tenho a certeza de que daremos os passos certos num futuro muito próximo.